1. O que é a «inovação» nas artes?

Participar na esfera da inovação tende, hoje, a ter um sentido de «perpétua inovação», o que dilui a especificidade do gesto. Essa «perpétua inovação» faz parte das dinâmicas tecnológicas do capitalismo avançado. É o seu impossível programa político que se desfaz ante os nossos olhos.

Se a inovação implicava a destruição daquilo a que ela se opunha, na perpétua inovação não há um lugar claro para o gesto de destruição, apenas para o devir obsoleto. O que é a destruição estética, hoje, senão a paródia da revolução, aqui encenada pelas artes tecnológicas?

2. O que citamos nas artes?

A produção, em arte, era solidária de uma estrutura complexa entre memória e esquecimento. Esse era o quadro que a História da Arte organizava.

Os suportes artísticos articulam-se, hoje, com um arquivo em rede que torna a evacuação impossível. Significa isso que a própria dinâmica dos modernismos se encontra impossibilitada? Toda a citação convoca aqui o sublime, crise provocada pelo excesso de informação. Ridículo da originalidade. Toda a citação dá, hoje, voz ao doido em nós que reescreve Guerra e Paz.

3. Qual é o papel das técnicas na criatividade artística?

Sabendo que a técnica nunca foi exógena à criatividade artística, qual a razão deste pleonasmo «artes tecnológicas»?

Será porque se trata aqui de uma intervenção tecno-lógica, dotada ela própria de um programa (artístico)? Introduzem estas a heterogeneidade necessária a toda a criação? Será porque a tecnologia contemporânea veio destruir os domínios que delimitavam o artístico, o racional, o imaginário? As técnicas transformam-se, paulatinamente, em dispositivos narratológicos, em critérios da construção da personagem, em modelos de encenação. Em breve, viveremos entre estruturas de ficção, que não são mais do que a arquitectura que vem.

4. O nomadismo técnico determina o nomadismo artístico?

Em que medida a transformação das relações epistemológicas e sociais entre ciência e técnica determina, hoje, a transformação das relações estéticas entre convenção e prática artística? Há aqui uma cena equívoca, já que todos queremos partir. Mas «partir» é, hoje, a parte incoativa da verbalização própria dos nossos ecrãs. O que significa que, perante o ecrã, vemos sempre mais do que imagens aí geradas: vemos promessas de uma vida paradisíaca no além-ecrã.

5. São as artes tecnológicas uma manifestação da «interiorização» da tecno-ciência?

Sabemos que a herança da tecno-ciência moderna é profundamente exterior à autoconsciência dos modernos, ou seja, que ela estava fundada numa relação de exterioridade (“manipulo a técnica, mas ela não me usa”) que preservava a castidade ontológica do humano. O progresso e a inovação eram figuras dessa relação instrumental.

Pode a introdução da aisthesis (o sensível) na relação com as técnicas modernas actualizar e aprofundar a constituição sexual da experiência? Não será ela a manifestação de uma história de posse incestuosa, história edipiana onde aquele que penetra repete apenas a penetração originária? Pela aesthesis tecnológica entramos no lugar que deveríamos ter esquecido e ao qual era suposto não voltarmos.


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Doutorado em Ciências da Comunicação pela U. Nova de Lisboa. Actualmente, é professor na ULHT e investigador no CECL-UNL. Publicou A Impossível Experiência Final da Modernidade, FCG. Tem colaboração dispersa por jornais e revistas é membro permanente da equipa NADA.


 

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